quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

cartas a um jovem poeta - R. M. R.



"Roma, 14 de Maio de 1904

Também amar é bom: porque o amor é difícil. O amor de uma pessoa por outra: é talvez essa a maior dificuldade que conhecemos, o extremo, a última prova e teste, o trabalho que todos os outros trabalhos apenas preparam. É por isso que a juventude, que é principiante em tudo, não pode ainda amar: tem de aprender primeiro. Com todo o seu ser, com todas as suas forças, concentrada no seu coração solitário e aflito que bate em movimento ascendente, tem de aprender a amar. Mas o tempo de aprendizagem é sempre longo e fechado, e por isso para quem ama o amor é solidão por muito tempo, pela vida fora, é um isolamento que ascende e se aprofunda. Amar não tem de início nada que ver com abrir-se, entregar-se e unir-se a uma outra pessoa (pois o que seria uma união do que ainda não se esclareceu nem completou,, do que ainda se subordina...?), é antes uma ocasião sublime concedida ao indivíduo para que ele possa amadurecer, tornar-se qualquer coisa dentro de si, tornar-se mundo, tornar-se mundo para si em nome de um outro, é um imperativo grande e imodesto que faz dele o eleito e o chama para a distância. É só neste sentido, enquanto injunção para trabalhar dentro de si, que a juventude poderá usar o amor que lhe é dado. A abertura e a entrega e toda a espécie de comunhão não é para ela (que terá ainda de poupar e guardar por muito, muito tempo), é o último estádio, é talvez qualquer coisa que a vida humana agora ainda mal pode alcançar.
Mas nisto os jovens (impacientes por natureza) erram tantas vezes e tão gravemente: lançam o corpo contra outro corpo, quando conhecem o amor, e dispersam-se, tal como são, em todo o seu desalinho, desordem, confusão... Mas o que pode nascer daqui? O que pode a vida fazer deste amontoado de gente rasgada ao meio a que eles chamam de comunhão e a que gostariam de chamar felicidade e, se for caso disso, o seu futuro? Cada um perde-se por causa do outro e perde o outro e perde muitos outros que estariam ainda por vir. (...)"

1 comentário:

A. disse...

(se houvesse algum simbolo de sorriso amargo estaria aqui...)