Estranhas os gestos. O silêncio rói-te a pele em sinal de derrota, deixas cair a cabeça sobre o mundo inteiro. O dia grita lá fora, a vida corre lá fora e tu dizes um dia. Sinto-me do avesso. Há qualquer coisa que grita nas paredes, que se some na cozinha, que se evapora lá fora, não sei se crianças, se sonhos, se céus. Há qualquer coisa que suplica, que rasteja, esta fome, este ar, este não-sei-o-quê que me consome, me habita, me dói. Qualquer coisa que me destrói e me quer lá fora.
Despes-te, as pernas arranhadas por silvas invisíveis, ruas estreitas em que te encolhes e não passas, e tu consolas-te dizendo que afinal querias outro caminho, há sempre outro caminho, cada um escolhe a sua rua. As horas são cruas quando não estás, sabem-me estranhas na boca, não as reconheço, talvez um dia. Pensas um dia. Mas não dizes nada. Porque tudo te é estranho quando não estás, o papel que te queima e as palavras que ecoam e se repetem nos olhos da multidão. Tanta gente, tantas vidas, que desperdício.
Trago a insónia pela mão, companheira, e no pulso trago a vida de alguém que não conheço. Não quero. Lá fora. O dia avança dependente, paira qualquer coisa no ar, não sei se um cheiro se uma voz. E tu resolves, dizes um dia, mas não queres. És demasiado grande para tua pele, que não se estica, se rasga, se perde. De vez em quando vibras, agitas-te, e acordas: há que se existir nalgum lado, lá fora, quem sabe.
1 comentário:
Adorei
Esta acabado? no final senti-me um bcdo suspenso na espera de qualquer coisa...
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